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JOAN MONTANÉ: ENTREVISTA NO DIÁRIO VASCO

Palomas
«Uma de cada cinco pessoas sofreu abusos sexuais na infância»
Seu pai abusou dele e Joan, através de seus livros, denuncia esta marca oculta

Se está na rua, olhe a seu arredor. Uma de cada cinco pessoas que veja sofreu abusos sexuais na infância, segundo o escritor barcelonês Joan Montané. Pelo que ele e outros muitos sustentam, os agressores também não andam longe, e muito possivelmente você os trata a diário. Deve cundir a desconfiança? «O inimigo está em casa», adverte Montané, quem a sexta-feira apresentou em Donostia seu livro Os meninos que um dia deixaram de sonhar, arropado pela associação de vítimas guipuzcoana, GASJE.
UNAI MARAÑA

- Assegura que uma de cada quatro mulheres e um de cada cinco homens sofreram abusos sexuais em sua infância.
- As estatísticas sempre há que as tomar como uma referência para fazer-nos uma idéia da gravidade do abuso. As mais manejadas arrojam do que o 20% da população sofreu abusos sexuais antes dos 17 anos, desde os mais graves até tocamientos ou exibicionismo.

- Como se calcula?
- Não sou um grande fã das estatísticas neste sentido. Levam-te a perguntar-te quem responde a estas questões. Normalmente se tomam lugares de referência que talvez não são do tudo parciais. O catedrático de Salamanca Félix López foi quem fez os únicos estudos oficiais em Espanha até a data. Concluiu que o 15% dos homens e o 23% das mulheres sofreram abusos sexuais em sua infância. A estatística se fez em universidades e em toda Espanha a nível representativo. É o único estudo fiável e bem elaborado realizado no Estado.

- Quem são os autores? Estas cifras nos levam a perguntar-nos se devemos desconfiar de nossos chegados.
- De pequenos, advertem-nos contra os desconhecidos, mas não sobre os conhecidos. Graças ao foro que administro, que usam milhares de vítimas, fiz minhas próprias estatísticas. Perguntei pelos autores e participaram duzentas pessoas. Entre o 60 e o 70% de seus abusadores tinham sido familiares; os conhecidos, pessoas do meio além da própria família, representavam mais do 90%; só o 4 ou o 5% dos agressores tinham sido pessoas absolutamente alheias, estranhas a eles. O inimigo está em casa, mais do que fora.

- Seu pai abusou de você durante anos. A que idade começou seu pesadelo?
- É uma pergunta difícil de contestar quando o abuso foi intrafamiliar. Se falamos de abusos externos que podem supor um choque, um antes e um depois no menino, é mais fácil precisar. Nos familiares, o agressor normalmente já tem uma estratégia e o apresenta como um jogo a um menino pequeno que não sabe que é um abuso sexual. Para quando tens uma idade na que te dás conta de que não é normal, já estás atrapado nesta situação. Eu tenho recordações de tê-los sofrido aos seis ou sete anos, mas é muito provável que começassem antes.

- Seu anterior livro se chama Quando estivemos mortos. Essa frase descreveu sua vida?
- Sim, porque é uma época na que uma parte de ti está morta. Quando o verbalizas e te enfrentas a isso, dás-te conta de que antes estavas morto.

- Não foi consciente dos abusos sofridos até 2001, com 38 anos. Como chegou a essa consciência?
- Alguns não o recordam, mas eu nunca o esqueci, porque foram continuados e até uma idade avançada. Por mais do que a mente se esfuerce em esquecer os fatos traumáticos, em meu caso não era possível. Recordava-o, mas nunca pensava em isso. É algo que escondes em algum rincão de tua memória, como na papeleira do computador. Segue aí e te segue afetando, até que um dia saiu.

- Como saiu?
- De uma maneira imprevista, sem planejá-lo e sem ser consciente do significado que tinha o que dizia. Se o contei a minha mulher quando atravessávamos uma crise, devida a que os abusos me tinham gerado muitas seqüelas e problemas. A relação estava a ponto de romper-se. Um dia, numa situação limite, se o contei porque não via outra saída. Ela sim que se fez cargo do problema e entendeu sua gravidade, a mim me custou bem mais tempo. Eu tinha uma dissociação tal que não tinha assumido que toda minha vida tinha estado condicionada pelo que sofri em minha infância. Foi um processo de meses, no que me ajudaram um psicólogo e, sobretudo, uma associação similar à guipuzcoana GASJE.

- Este trauma só se supera com a recordação?
- Se começa a superar com o fato de verbalizá-lo, contá-lo, sacá-lo fora, a quanta mais gente, melhor, e se te enfrentas ao agressor, ainda melhor. É o caminho.

- Se enfrentou a seu pai?
- Em certa maneira, sim. Foi minha mulher quem o sacou à luz em minha família e a todos, e a partir daí não me ficou mais remédio que me enfrentar a isso. Com meu pai, dissemo-nos quatro coisas e cortamos a relação e nunca voltei a tê-la. Faz pouco, morreu.

- De pequeno, deixou você de sonhar, como os meninos de seu livro?
- O primeiro livro era mais vivencial, mais testimonial e pessoal. Este é uma recopilação de toda a experiência que tive, é mais reflexivo, e está muito centrado nas seqüelas. Roubam-te uma parte muito importante de ti. Tiram-te que possas descobrir a sexualidade, que descubras muitas coisas, e também sonhos.

- Se pode reconhecer a estes meninos?
- Sim há indicadores que podem levantar suspeitas. As associações tratam de formar aos profissionais em contato com meninos, como professores e pediatras, para que se fixem neles. Estas pistas são, entre outros, os retrocessos evolutivos, como voltar a orinarse na cama ou um baixo nas notas; condutas muito sexualizadas, impróprias da idade do menor; um menino que esteja abusando de outro é um indicativo clarísimo; e os transtornos alimentícios.

- Quais são as principais seqüelas psicológicas?
- Baixa autoestima, sentimento de culpa (frases como 'eu poderia ter feito algo para que não ocorresse'). Os vícios são comuns: álcool ou drogas, a comida, o jogo. A anorexia, a bulimia e as autolesiones são frequentes.

- Se rompem famílias?
- É o grande temor de quem não falam, mas contá-lo é a única maneira de superá-lo, e quanto às conseqüências, que cada qual assuma as suas.

Publicado por JoanMontane

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