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Os ANTECEDENTES INCESTUOSOS DO AVÔ

Palomas
Muitas mulheres que foram vítimas de incesto por parte de seus pais e que calaram esse abuso durante toda sua vida adulta, recém se sentem compelidas a confessá-lo -ou denunciá-lo- quando suas próprias filhas se acercam à puberdade e entablan um vínculo novo com esse avô que alguma vez foi um pai violador.
© Eva Giberti, agosto 2001.
RIMA: Red Informativa de Mujeres de Argentina
URL de este archivo: http://www.rimaweb.com.ar/infancia_adolescencia/egiberti_incesto.html
Imágen: Google

As vezes precisam anos de tratamento antes de poder contar que lhes sucedeu. Conquanto a consulta pôde ter sido originada por diversos sintomas (insônias reiteradas, ou desavenencias conjugais ou hartazgo da vida que levam), em determinado momento estoura a história que tingiu a meninice destas mulheres: a violação incestuosa que seu pai exerceu durante vários anos.

A tentativa de esquecê-lo, de repor-se como se aquilo não tivesse sucedido, o escamoteio do ódio e do asco para esse pai ocuparam a sensibilidade, a inteligência e o mundo emocional dessas mulheres que não puderam rebelar-se quando o varão que devia protegê-las e acompanhá-las em seu desenvolvimento utilizava seus corpos infantis para produzir-se prazer.

Sendo meninas temeram confiar-se a suas mães porque supuseram, assim o contam algumas delas, que não só não lhes creriam, senão que provavelmente as castigariam "por inventar porcarias". A experiência clínica nos evidência que, em algumas oportunidades, é bem como sucede.

Por que estas mulheres adultas, que decorrem suas quarenta e seus cinquenta anos recém agora podem descrever que lhes ocorreu?
Porque, com freqüência, suas filhas, agora púberes ou adolescentes, entablan um vínculo novo com esse avô que foi um pai incestuoso. Um vínculo de jovem mulher, já não necessariamente como menina, senão como uma criatura que conversa com esse avô que opina a respeito de suas condutas. E lhes pergunta a respeito de seus noivos e de seus amigos. E com ufana tranqüilidade lhes recomenda que tenham comportamentos sensatos.

Como explicar a desconfiança para o avô?
As mães que foram incestuadas por esse sujeito, e que jamais o "confessaram" a seus maridos, agora titubeiam sem poder explicar-lhes a violência e a ira com que costumam contestar-lhes a esses avôs cujos antecedentes como violador elas padeceram.

Os fatos que durante anos tentaram sepultar reverdecen nas memórias atualmente ilustradas pelos temas que, vinculados com os abusos sexuais contra as meninas, instalam-se nos meios de comunicação. Conquanto essa informação mantém o erro de pretender que abuso sexual agravado por vínculo é equivalente a incesto, segundo a descrição legal, atinge para que algumas mulheres, antes meninas violadas por seus pais, reajam com a fúria que não puderam expressar quando eram victimizadas.

É essa fúria, sócia com um "não saber que fazer agora", a que se expressa nos tratamentos, e permite compreender como funcionaram, durante anos, os efeitos dessa terrível experiência na vida destas mulheres. Elas decorreram seus anos juvenis entrampadas nas convenções sociais que as obrigaram a conviver com o violador, recordando a satisfação que a prática incestuosa lhe produzia a esse varão ao que deviam seguir reconhecendo e nomeando "pai".

A aparição verbal das recordações, recorrendo à contenção da psicanálise, permite-lhes, por uma parte, recuperar a representação das situações, dos dias e das noites durante os quais esse sujeito se aparecia em sua habitação em ausência da mãe, ou bem quando deviam decorrer suas férias ao lado desse homem que reclamava seu direito à pátria potestade por estar divorciado da mãe.

Por outra parte se abre o espaço para perguntar-se: que fazer agora? Uma delas me disse: "Eu quisesse matá-lo" e outras duvidam a respeito dos efeitos que poderiam resultar da atual confissão.

Em mudança todas coincidem ao avaliar a relação desse sujeito com a filha delas, menina ou púber: resistem-se a autorizar qualquer classe de relação próxima com esse avô. O qual costuma aparecer como inexplicável no grupo familiar.

Conquanto é possível dedicar-lhe longo tempo à análise dos fatos, às recordações, às fantasias quando se trata de mulheres em tratamento psicoanalítico, começaram a aparecer consultas por parte de mulheres que não solicitam tratamento senão alguma índole de recomendação a respeito do melhor modo de proceder respecto de suas filhas, em relação com esse avô.

Isto é, é possível supor que não podem, não querem reabrir a memória incandescente do que padeceram, mas sim decidiram utilizar a sombra daquelas recordações para atuar preventivamente respecto de suas filhas. Mas este avô não necessariamente mantém um entusiasmo paidófilo, não necessariamente tentará manusear a sua neta e só em algum caso encontrei a suspeita concreta a respeito desse procedimento contra a neta/menina. Estas mulheres, que foram meninas violadas por seus pais e que atualmente são mães, procuram o alívio que significa falar a respeito dessa porção de suas vidas, dos efeitos que padeceram, e ao mesmo tempo tentam posicionar-se frente a esse pai reconhecendo-o como um violador sistemático, isto é, como um delinquente.

O esclarecimento sociopolítico do que agora dispõem numerosas mulheres, e com o qual não contavam décadas atrás, permite-lhes compreender que decorreram sua meninice fazendo parte da categoria das vítimas; já não se trata de acusar ao sujeito posicionando-o só como incestuoso, senão que dito delito também viola os direitos das meninas, além de violar seus corpos e além de interferir de maneira patológica na construção da subjetividade da vítima.

As mães destas mães
Capítulo aparte é o que nestas consultas se dedica às que agora são avós e foram o casal daquele pai incestuoso: as mães destas mulheres que agora conferem. Que lhes ocorreu? Não se deram conta? Sabiam o que passava mas preferiram tolerá-lo? Elas mesmas foram vítimas de pais incestuosos e interpretaram como fatalidade essa classe de relação? Minha experiência no tema me ensinou que, nas classes populares, quando o incesto é descoberto ou reconhecido pela mãe pode silenciar-se porque se sabe que o cárcere para o violador significará a fome para o resto da família. Nossa legislação ao respecto produz um paradoxo carente de ingenuidade: "Deixemos em liberdade ao incestuoso para que possa seguir mantendo à família. Em todo caso internemos à menina num instituto porque corre perigo moral": um disparate compreensível mediante a análise dos efeitos das ideologias patriarcais na redação das leis e das políticas sociais. Um trastocamiento ético que mantém sua eficácia graças à colonização intelectual de legisladores e profissionais intervinientes nestas histórias. Mas quando as consultas provem de outros grupos sociais a avaliação dos comportamentos daquelas mães, agora avós, reclama outros refinamentos técnicos, que fazem parte dos interrogantes que se propõem as mulheres que atualmente conferem: "Minha mãe não se dava conta" ou bem "Se se o tivesse contado ela não o poderia crer". Quarenta anos atrás aquelas mulheres tivessem aceitado como possível que seu marido fosse capaz de algo semelhante? O desenvolvimento desta problemática é extenso e não admite simplificações. Em mudança nos adverte a respeito dos novos registos das mulheres a respeito de seus direitos, dos direitos de suas filhas e do valor que adquiriu a palavra da mulher quando denúncia, quando narra, quando questiona, quando fala, quando se defende, quando promove o juízo crítico e o respeito por sua história de vida. Porque o pessoal é político.

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